Intensificar um sistema de produção significa otimizar a
utilização dos recursos que resultam no produto final. No caso de produção de
leite a pasto, os dois principais recursos são a vaca e o capim. Para otimizar
a interação entre esses dois recursos (animal e pasto) na produção de leite, é
necessário que se conheça bem as características da planta e do animal, bem
como os mecanismos pelos quais ocorre relação entre eles. Discutiremos alguns pontos importantes sobre fisiologia da planta
forrageira e como a estrutura do pasto pode afetar o consumo do animal.
Fisiologia da planta forrageira
Em condição de crescimento livre, o acúmulo de forragem
do pasto é resultado do balanço entre processos de fotossíntese, respiração,
produção de novos tecidos, senescência e morte. No início do crescimento da
planta, conforme a área de folhas e a fotossíntese aumentam, a taxa de
aparecimento de novos tecidos é acelerada. O processo de senescência, por sua
vez, só se inicia quando a planta atinge um determinado número de folhas
(geneticamente determinado) ou se houver alguma limitação nas condições de
crescimento (água, luz ou nutrientes). Dessa forma, ocorre um atraso entre os
processos de crescimento e senescência, permitindo acúmulo líquido de forragem
(crescimento maior que senescência). A partir de certo momento, cuja velocidade
depende das condições de crescimento, as taxas de aparecimento e senescência se
igualam (ou seja, uma folha senesce para cada folha nova que aparece) e o
acúmulo líquido é zero, apesar da massa de forragem continuar aumentando (com
crescente participação de material morto).
Pensando sobre isso podemos concluir que é mais
interessante, do ponto de vista de eficiência de utilização do pasto, que a
colheita da planta aconteça no seu ponto de máximo de acúmulo líquido, antes
das perdas por senescência se iniciarem. Pesquisas desenvolvidas inicialmente
com plantas forrageiras temperadas, estudando as taxas de aparecimento e morte
de tecidos, determinaram que esse ponto de acúmulo líquido máximo é atingido
quando o dossel intercepta 95% da luz incidente. Posteriormente, o mesmo
comportamento foi observado para plantas tropicais em estudos realizados nos
últimos 20 anos no Brasil.
Deixar a planta crescer a partir desse ponto não é
vantajoso por diversos motivos. O primeiro é relacionado ao não aproveitamento
do ponto de acúmulo máximo, como discutido anteriormente. Além disso, a partir
deste ponto no crescimento, as folhas mais novas (que aparecem no alto do
dossel) começam a sombrear as mais velhas e inicia-se competição por luz.
Quando plantas tropicais detectam competição por luz, passam a priorizar
produção de colmos para colocar suas folhas novas em alturas mais elevadas do
dossel. Isso não somente dificulta o consumo, como veremos mais a frente neste
artigo, como também reduz o valor nutritivo da forragem, já que colmos
apresentam mais parede celular, menos digestível, em detrimento de conteúdo
celular, que é mais digestível.
Além do crescimento, é importante entendermos também como
o pasto pode se adaptar a diferentes condições de crescimento a ele impostas,
seja por corte ou pastejo. Essa adaptação envolve medidas de curto e longo
prazo. No curto prazo, basicamente a planta altera a partição dos nutrientes
entre órgãos de reserva e folhas. Por exemplo, pasto mantido mais alto envia
parte dos nutrientes para seus órgãos de reserva, como raiz e base do colmo.
Essa reserva será necessária em situação de redução drástica da área foliar,
quando a fotossíntese não é capaz de suprir toda demanda de nutrientes
necessária para o crescimento da planta. Por outro lado, quando o pasto é
mantido mais baixo, a prioridade da planta é direcionar nutrientes para
produção de folhas novas, mais eficientes fotossinteticamente, para garantir a
continuidade de seu crescimento. Em uma situação como essa, a planta deixa de acumular
nutrientes em seus órgãos de reserva, e terá rebrotação mais lenta em uma
eventual desfolha severa.
Se a condição do pasto for mantida por longo período, a
planta lança mão de alterações em sua estrutura e na arquitetura do dossel,
sempre visando otimizar a interceptação de luz. Um exemplo de alterações de
arquitetura do dossel é o ângulo das folhas, que será mais horizontal em pastos
baixos, pois as folhas são menores e precisam da disposição horizontal para
interceptar mais luz. Por outro lado, pastos maiores apresentam folhas mais
eretas, pois cada planta tem área de folhas maior. Além disso, a densidade de
população de plantas (número de plantas individuais por área de solo) pode
aumentar ou diminuir de acordo com a altura em que o dossel é mantido. Em
pastos mais altos cada planta individual tem maior tamanho, então o número de
plantas diminui e vice-versa, de modo a garantir a mesma área foliar e
interceptação de luz.
Podemos concluir, portanto, que as plantas forrageiras
têm grande capacidade adaptativa quando submetidas a uma amplitude considerável
de manejos. O critério de decisão sobre qual a condição ideal de exploração
deve envolver, portanto, um segundo agente essencial para o sistema: o animal.
Consumo de forragem
No sistema de produção de leite em pastagens, a vaca é
responsável pela sua própria colheita de forragem. A “máquina” de colheita do
animal ruminante consiste de seu aparato bucal. No período de um dia, o bovino
é capaz de desenvolver de 20 a 40 mil movimentos mandibulares para mastigação,
acomodação e deglutição do bolo alimentar. Além disso, mais 15 a 20 mil
movimentos diários são dedicados à ruminação. Cada movimento de apreensão de
alimento, chamado bocado, permite ao animal adulto em pastejo consumir de 0,2 a
1 g de matéria seca de capim. O tempo que um animal passa pastejando é
dependente de vários fatores, mas pode variar entre 6 e 12 horas diárias. O
conjunto de todos esses fatores (número de bocados, massa de forragem por
bocado e tempo de pastejo diário) representa, ao fim do dia, a quantidade de
forragem consumida pelo animal.
Para se ter uma ideia da quantidade de forragem que um
bovino consegue consumir, vamos pensar em uma vaca adulta com peso de 500 kg.
Esse animal é capaz de ingerir 80 kg de massa verde de capim por dia, o que
representa algo em torno de 10-12 kg de MS. Para isso, a vaca terá que pastejar
uma área maior do que 40 m2 de capim e caminhar de 3 a 4 km. O gasto de energia
nesse processo é muito grande e por isso, quanto melhor a forma que a forragem for
oferecida, maior o potencial de consumo e, consequentemente, de desempenho
animal.
O processo de consumo de forragem de animais em pastagens
pode ser desdobrado em diversos níveis de estudo, com diferentes variáveis em
cada nível, como mostra a figura 1, abaixo:
Figura 1. Variáveis componentes do consumo de forragem em
animais mantidos em pastagens
A partir do entendimento dessa figura é possível perceber
como o consumo de pasto é dependente tanto do animal, que apresenta limitação
física para número máximo de bocados e tempo máximo de pastejo por dia, quanto
das características estruturais do pasto, que definem a massa do bocado. Apesar
da densidade da forragem (kg MS/ha por cm de altura do dossel) ter grande
importância na massa do bocado, a característica do pasto que mais influencia o
consumo é a altura do pasto. Isso ocorre porque a área do bocado é
relativamente fixa devido à largura da mandíbula (8-9 cm) e ao comprimento da
língua do animal apresentarem pouca alteração.
Portanto, dentre as variáveis determinantes do volume do
bocado, a profundidade do bocado tem maior importância relativa. A profundidade
do bocado, por sua vez, é dependente da altura e estrutura do pasto, já que
estas representam o quanto o animal consegue aprofundar sua cabeça no dossel
forrageiro. Pastos mais baixos ou com participação de colmos no estrato
superior reduzem drasticamente a profundidade do bocado, provocando reduções
tamanhas na massa de bocado que não são possíveis de serem compensadas pelo
aumento na taxa de bocados, resultando em queda no consumo diário de forragem.
Dessa forma, é possível concluir que a estrutura do pasto
é a variável que reúne os interesses de animais e plantas no sistema. Do ponto
de vista da planta, a estrutura do pasto representa o tamanho, qualidade e
eficiência de seu aparato fotossintético e reflete o acúmulo e a abundância de
forragem. Do lado do animal, representa a forma como a forragem é apresentada,
sua apreensibilidade e facilidade de colheita, refletindo no consumo do pasto.
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